Após intervenção do ministro Alexande de Moras, do Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente da República, Jair Bolsonaro, desistiu de nomear o amigo Alexandre Ramagem para a direção da Polícia Federal. Até novos acontecimentos, Ramagem permanece como diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a PF continua sem diretor-geral.
A jurista, advogada criminalista e mestre em Direito Penal, Jacqueline Valles, avalia que o recuo do presidente significou o retorno à normalidade democrática, já que todos os brasileiros devem obediência à Constituição Federal e o presidente da República, independentemente de partido político e orientação ideológica, não tem plenos poderes para agir como bem entender. Bolsonaro tem a obrigação de obedecer a Constituição Federal, que regula todas as leis e ações dos governos. “Ao contrário do que o presidente disse recentemente, ele não é a Constituição. Ele a obedece. E isso tem que nortear todas as ações do governo federal”, aponta a criminalista.
Jacqueline reforça que a ação do ministro Alexandre foi correta e que a nomeação de Ramagem feria os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade. “Ramagem é amigo da família Bolsonaro. Sabemos que dois de seus filhos são alvos de investigações da PF. Além disso, as próprias declarações do presidente na semana passada, confirmando que tinha que ter um relacionamento direto com o diretor-geral para que soubesse do andamento de todas as investigações, demonstra uma vontade de impor seus interesses mais pessoais, o que é incompatível com qualquer agente público, cujos atos deveriam ser determinados por princípios da Constituição Federal”, argumenta.
O STF, afirma a jurista, cumpre o seu papel de guardião da Constituição. “O STF é o órgão que fiscaliza os poderes e faz cumprir a Carta Magna. Não se trata de interferência desnecessária. É preciso garantir que a Polícia Federal tenha sua autonomia de investigar quem quer que seja, como preconiza a Constituição. Permitir a nomeação de um amigo da família do presidente para dirigi-la atingiria diretamente o princípio da impessoalidade e colocaria em xeque a autonomia de um órgão tão importante”, completa a mestre em Direito Penal.
“Bolsonaro realmente tem a competência para escolher o diretor-geral da PF, mas essa nomeação foi ética, honesta e moral? O ato tem que ser honroso. Quando o ministro Alexandre de Moraes diz que a nomeação não foi moral, ele está certíssimo”, avalia Jacqueline. “Bolsonaro preferiu o recuo a enfrentar mais um desgaste com o STF e a própria sociedade, já nitidamente insatisfeita com as suas atitudes diante da tragédia sanitária que estamos enfrentando. Vamos ver até quando vai essa racionalidade”, finaliza Valles.