A Polícia Civil de Minas Gerais investiga a morte de um bebê durante o parto no dia 1º de maio, no Hospital das Clínicas, em Belo Horizonte. O caso ganhou repercussão nacional porque o bebê morreu após um parto induzido que contou com a chamada manobra de Kristeller (quando o profissional de saúde pressiona a barriga da gestante para forçar a saída do bebê). “É uma manobra proscrita, que não é mais aceita como prática médica porque estudos científicos robustos já demonstraram que ela é muito prejudicial tanto para a mãe quanto para o bebê. Então, quando ela é usada é uma violência obstétrica”, explica o advogado especialista em Direito Médico Idalvo Matos, do escritório BMF Advogados.
O advogado conta que é um direito da mulher decidir como quer dar à luz. Se a gestante manifestar, por exemplo, a vontade de se submeter a uma cesárea, precisa ser ouvida. Isso, claro, desde que o tipo de parto escolhido não incorra em riscos à mãe e bebê. “O médico precisa ter uma justificativa clínica para negar a vontade da gestante. Isso geralmente acontece em casos de urgência e emergência médicas, quando a vida da paciente ou do bebê correm risco e é preciso agir rápido. Ainda assim, essa justificativa precisa constar no prontuário médico e isso dá uma garantia tanto para o profissional, quanto para a mãe”, explica.
Plano de parto
Matos reforça que as escolhas da mulher devem constar no chamado plano de parto, que é definido em conjunto entre a mãe e o obstetra durante o pré-natal. “O médico precisa informar a mãe sobre os benefícios e riscos apresentados por cada tipo de parto para que a mulher tome sua decisão. E essa decisão precisa ser respeitada, por isso a parturiente tem direito a um acompanhante durante o parto e por isso é tão importante fazer o pré-natal”, comenta.
Se, por qualquer motivo, o plano de parto não for feito, a mulher ainda pode manifestar sua vontade em um termo. “A paciente pode fazer um termo e manifestar sua objeção a determinadas práticas, como a manobra de Kristeller e a episiotomia (corte no períneo para facilitar a nascimento do bebê), ambas consideradas violências obstétricas”, observa Matos.
Definição
Segundo o especialista, a violência obstétrica é todo ato que que cause dor, dano ou sofrimento desnecessário à mulher durante o pré-natal, parto ou puerpério. O conceito vai além das agressões físicas e humilhações, e inclui, além da manobra de Kristeller e episiotomia, a “recusa em permitir a presença de um acompanhante; negar anestesia; realizar procedimentos como o fórceps sem autorização da mulher; deixar de dar informações importantes. Todas essas práticas podem ser punidas pelo judiciário”, acrescenta o especialista.
No final do ano passado, a Justiça condenou um hospital de São Paulo a indenizar uma mulher após se recusar a fazer uma cesariana. No caso recente, em Minas Gerais, a advogada da família conta que a mulher pediu a realização da cesárea, mas a equipe do hospital resolveu induzir o parto. “A solução para evitar a violência obstétrica passa pela informação. Tanto para que os médicos evitem essas práticas, quanto para que as pacientes tenham noção dos seus direitos”, diz o advogado.
Legislação
Apesar de não haver uma legislação específica sobre o tema, magistrados que condenaram hospitais por violência obstétrica costumam se basear na Constituição Federal e no Código Civil. “O sequestro da autonomia da mulher pelos profissionais da saúde, por exemplo, contraria o princípio da proteção à dignidade da pessoa humana. A Constituição Federal também prevê que ninguém será submetido a tortura, tratamento desumano ou degradante. E o artigo 15 do Código Civil determina que ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica”, completa o advogado.