A empresa de telefonia móvel OI pagou uma taxa de R$ 350 para interpor um agravo de instrumento no Tribunal de Justiça de São Paulo para não ter que pagar R$ 17,82 de honorários a uma conciliadora que presidiu a audiência de acordo com a empresa no Centro Judiciário de Solução de Conflitos (CEJUSC) do Foro Regional de Santo Amaro. O valor gasto apenas com o pagamento de taxa para a interposição do recurso é quase 20 vezes maior que o honorário devido à mediadora.
Na ação judicial, a Oi alega uma suposta arbitrariedade da cobrança e ilegalidade da Resolução nº 809 de 2019 do TJSP. “A remuneração dos mediadores e conciliadores judiciais tem natureza de despesa processual e está amparada não apenas na Resolução 809/19 do TJSP, como também em resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na Lei de Mediação e no Código de Processo Civil”, explica a advogada Fernanda D’Agostini de Oliveira, que representa a conciliadora. As partes aguardam o julgamento do agravo.
O recurso causou indignação entre os conciliadores, primeiramente porque o trabalho da profissional possibilitou que a empresa fechasse um acordo no processo e porque a remuneração desses profissionais, cuja atuação vem sendo cada vez mais requisitada pelo Judiciário, é uma conquista que vem de anos de trabalho árduo do sindicato da categoria em busca do reconhecimento desses profissionais. “Do ponto de vista técnico-jurídico, causa indignação porque a Conciliação Judicial tem como princípio fundamental a voluntariedade e autonomia da vontade dos envolvidos no procedimento. Ou seja, se uma das partes não concorda em remunerar o profissional pelos serviços prestados, pode escolher por não participar da Conciliação e deve ter sua decisão respeitada”, comenta Fernanda.
Reincidente
Esta não é a primeira vez que a OI desrespeita o trabalho dos conciliadores que solucionam suas demandas. Em 2021, a empresa recorreu ao Juizado Especial da Comarca de Santos para não pagar R$ 60 de honorários da mediação. Na época, a empresa gastou R$ 300 para interpor o recurso, negado pelo juiz Thomaz Côrrea Farqui. Na decisão o magistrado escreveu: “A recorrente, ao invés de recolher meros R$ 60 para custear ato processual a que deu causa, preferiu interpor recurso inominado, gerando, além de um custo de mais de R$ 300 para si, prejuízo ao erário, bem como, ainda, aumentando o volume de demandas. Por meio de recurso flagrantemente infundado, desviou a atenção do Judiciário, que deveria voltar-se a demandas reais, solucionando conflitos de interesses, e passou a apreciar recurso de valor pífio, sobretudo para a recorrente”.
Em seis anos de atuação, essa é a primeira vez que a conciliadora, que também é advogada pós-graduada em Direito de Família e Sucessões, Direito do Consumidor e Direito Sistêmico, passa por uma situação como essa. “Foi uma sensação de muita tristeza e indignação. A gente faz um trabalho importante, necessário e que facilita a vida das pessoas, podendo até pôr fim ao conflito, para no final, passar pela humilhação de ter que defender o reconhecimento do trabalho e o direito de receber pelo serviço prestado”, resume.
Amicus Curiae
O Sindicato dos Mediadores e Conciliadores do Estado de São Paulo (SIMEC-SP), entidade que vem lutando há anos para que os mediadores sejam remunerados pelo seu trabalho na Justiça Gratuita, está acompanhando o processo como Amicus Curiae. “Esse caso demonstra um desrespeito total com o trabalho de milhares de mediadores de São Paulo que, com a sua atuação, auxiliam as partes a selarem acordos que finalizam e até evitam a abertura de novos processos. Os ganhos são muitos não só para as partes envolvidas, mas para todo Judiciário Paulista, já que essa atuação contribui para a celeridade do Judiciário”, afirma a advogada e conciliadora Márcia Cristina da Silva Cambiaghi, presidente do SIMEC.
Pagar para trabalhar
Além dos altos investimentos que um conciliador deve fazer na sua formação para poder pleitear um credenciamento junto ao Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), há uma série de atualizações necessárias para se manter em atividade. “O mediador que atua hoje em São Paulo, muitas vezes, acaba pagando para trabalhar. Ele é obrigado a fazer um alto investimento tanto em cursos de capacitação e especialização, quanto no tempo em que permanece à disposição do Tribunal, e ainda se depara com a ausência de remuneração das demandas da Justiça Gratuita e com casos absurdos como esse”, explica a presidente do SIMEC.